Tudo o que fazemos e pensamos acontece dentro de um espaço de tempo. Existem aparelhos capazes de medir precisamente o tempo que decorre entre o início de um acontecimento e seu final - são chamados de relógios. Eles podem medir com precisão, por exemplo, quanto tempo um atleta leva para percorrer a distância de cem metros, entre outras coisas.
Há vários tipos de relógios, mas todos marcam o mesmo tempo. E o fato de existir um relógio para marcar o tempo pode fazer com que este mesmo tempo pareça virtualmente maior ou menor, dependendo da situação.
Tenório, por exemplo, não tinha tempo, pois logo iria morrer. E sabia disso. E o fato de ele saber disso fazia com que o seu tempo se passasse ainda mais rápido, embora fosse o mesmo tempo que transcorria para Ana. A diferença é que Ana, por sua vez, não via o tempo passar, tão atolada que estava; imersa em seus próprios dias...
É bom ressaltar que outro problema temporal pelo qual Tenório passava lhe era extremamente cruel: a sós com uma linda mulher, ele precisava de tempo para inventar uma desculpa plausível do porquê de haver um Viagra rolando pelo chão de sua sala.
Tenório teve a impressão de que
estava ficando vermelho. Bem, talvez roxo de vergonha. Amaldiçoou mentalmente o
jeans velho que estava usando. Como não
tinha percebido que o bolso estava furado?
Parecia que o ar sumia dos seus
pulmões e seu estômago deslocava-se dentro de sua barriga, enquanto assistia ao
Viagra caído de seu bolso girar no chão, ao lado de seu pé, sob o olhar
desconfiado de Ana.
- O que é isso? - Perguntou ela,
enquanto inclinava-se para frente para colher o Viagra com uma das mãos.
- Isso o quê? - Tenório respondeu,
enquanto repetia o gesto dela, inclinando-se e ”acidentalmente” esmagando o
comprimido com a sola do sapato.
- Ops! O que é isso? Puxa, acho
que era um remédio... Quero dizer, era o meu remédio!
- Remédio? - Pelo tom da voz de
Ana, ele percebeu que ela devia estar levemente desconfiada.
- Sim! Puxa, que azar, esses
remédios custam uma fortuna! Deve ter caído do meu bolso. - Explicou ele. E era
verdade: o remédio era caro mesmo; uma fortuna, na avaliação de Tenório.
- Você não tinha me dito que
tomava algum medicamento. Este vinho não corta o efeito? - Ana tentava educadamente
encontrar uma forma de ele contar que pílula era aquela. Tentava não ser
invasiva demais.
- Olha, Ana, acredito que deva
cortar um pouco. Só que aqui, com você, sinto-me bem como não me sentia em sei
lá quanto tempo, sabe? Então acho que não me faz tanta falta agora. O remédio,
quero dizer. Tanto que até tinha esquecido de tomar.
- Que bom... fico feliz de estar
aqui com você também. A gente precisa disso de vez em quando...
- Nem me fale! Fazia muito tempo
que não me sentia tão bem sem usar esses remédios para levantar o humor! - Disse Tenório, enquanto dava
um risinho nervoso e tinha a sensação de sentir um calor estranho,
inconveniente e repentino.
- Ah, são para levantar o humor?
- Sim! É que meu médico não me
deu boas notícias ultimamente. Aí me mandou em um psicólogo, que me receitou
isso.
- Engraçado... que eu saiba
psicólogos não podem receitar medicação, só psiquiatras.
- Ahm, bem... é que ele é meu
amigo, e conseguiu que um colega dele, psiquiatra, emitisse a receita, sabe...
- Ah, que sorte a sua!
Tenório tentava contornar a
situação embaraçosa na qual havia se metido. E agora? Tudo estava ruindo. Indo
por água abaixo. Ana poderia levantar, agradecer e ir embora a qualquer
momento. Não! Ele não deixaria isso
acontecer. Não esta noite. Já que não lhe restava tanto tempo, resolveu tomar
medidas drásticas e ativar o “plano D” - de desesperado.
- Ana, eu não pretendia te contar
isso, não esta noite. Mas é que eu vou morrer.
- Ah, eu também vou...
- Não, Ana, você não entendeu.
Quando falei das más notícias que o médico me deu eu me referia a isso. Vou
morrer logo. Muito logo.
- Puxa, Tenório, como assim? Mas
o que...
- Não, Ana, não me faça mais
perguntas. Só queria que você soubesse e visse que sou um homem diferente
agora. E achei que poderíamos passar bons momentos juntos. É isso que quero
para minha vida, entende? Viver ao máximo cada segundo. Aproveitar tudo, pois
amanhã posso não estar aqui.
A expressão de Ana mudou, e agora
que ela parecia seriamente preocupada ele aproveitava-se disso para fazer-se de
coitado e tentar levá-la para cama de uma vez por todas. Enquanto falava, ele
chegou mais perto dela e tomou sua mão. Agora ele precisava dar o golpe final,
e tudo daria certo.
Se é que seria tão simples e
fácil assim...