quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Uma Vida em Terceira Pessoa


Não é segredo pra ninguém que eu curto escrever. Se você me conhece e ainda não sabia disso, foi apenas porque nunca me perguntou. Até entendo, pois eu mesmo nunca cheguei em um amigo ou conhecido de longa data e perguntei:
- Você gosta de escrever?
Não. Não é o tipo de coisa que se pergunte a alguém. Mas o que estava dizendo, e aqui retomo, é que gosto tanto de escrever que sempre o faço em um momento ou outro do meu dia. Do nada, pá! Estou escrevendo. Só que nem sempre escrevo em papel. Leia-se: nem sempre escrevo em lugar algum. Há inúmeras situações em que imagino um desfecho diferente para coisas corriqueiras do cotidiano. Qualquer situação mesmo. Estou lavando uma faca na pia e, acometido de um mal súbito, desmaio sobre ela e sangro até a morte. Tudo bem, estou exagerando, é raro alguém morrer nas minhas histórias. Tudo bem, estou mentindo, na maioria das vezes alguém morre nas minhas histórias. E o exemplo que dei foi o mais esdrúxulo que eu poderia ter encontrado. O lance é que quando vejo algo acontecendo, fico me perguntando como seria se tivesse sido diferente, e aí escrevo uma história na minha cabeça, e ela nunca vai entrar no papel.
Nos meus tempos de criança eu gostava de me imaginar dentro de um filme de suspense estilo Alien: o oitavo passageiro, sozinho pelos dutos escuros de uma nave no melhor estilo anos 80, com um detector de movimentos me colocando em sucessivas enrascadas. Passava tardes exterminando monstros alienígenas ou sendo caçado por eles.
Depois, nos meus tempos pré-aborrecência, pegava caminhos ermos e escuros para voltar para casa quando já era tarde da noite. Ruas e becos de pedra-brita, onde só o que dava para ouvir eram meus passos. Quando não havia luar, então... A rua era breu, e a trilha sonora era o tram tram tram tram de meus pés esmagando as pedras em um ritmo constante. Parecia trilha de um Hitchcock. Mas o maior barulho era aqui dentro: minha mente ia inventando mil coisas absurdas, alimentada pela adrenalina. E aí eu se transformava em ele: Ele caminhava solitário pela noite escura, sem perceber que sua vida corria um imenso perigo...
E, assim, um percentual considerável da minha vida acabou sendo em terceira pessoa.

E hoje ainda é.

Acontece comigo. Acho que acontece com você, também. Afinal, meu cérebro e o seu foram feitos da mesma forma, das mesmas substâncias químicas e têm o mesmo tamanho. Não tem como sermos tão diferentes assim. Ou tem?

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